Ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger morre aos 100 anos; veja repercussão
Diplomata americano mais poderoso do século XX, ele intermediou vários acordos e, em 1973, recebeu o Nobel da Paz por negociar a trégua com o Vietnã. A premiação foi muito criticada. Morreu, aos 100 anos, o ex-secretário de estado americano Henry Kissinger
Morreu, aos 100 anos, o ex-secretário de Estado americano Henry Kissinger, o diplomata mais influente no século 20.
O menino Heinz, que nasceu em Furth, na Alemanha, em 1923, adorava futebol, mas logo percebeu que não tinha lugar para um menino judeu no time em meio à ascensão do nazismo.
Em 1938, a família de Kissinger migrou para os Estados Unidos. Ele voltou ao país natal para lutar na Segunda Guerra e, ao fim do conflito, recebeu a missão de caçar ex-oficiais nazistas.
Ele se formou em ciências políticas na Universidade Harvard, onde começou uma carreira acadêmica, mas a política falou mais alto.
Em 1969, foi nomeado conselheiro de segurança nacional pelo então presidente Richard Nixon. Três anos depois, em plena Guerra Fria, Kissinger surpreendeu o mundo ao articular uma aproximação com a China comunista.
O aperto de mão entre Nixon e o líder chinês Mao Tsé Tung mudou a história. A professora de relações internacionais da Universidade Nova York Carolyn Kissane disse que estreitar os laços com a China abriu caminho para a rápida modernização da economia chinesa.
Ainda durante o governo Nixon, Kissinger apoiou bombardeios secretos ao Camboja para pressionar o Vietnã a aceitar um cessar-fogo com os Estados Unidos; 50 mil civis morreram.
Em 1973, ele se tornou secretário de Estado, e ficou conhecido como o secretário que usava bombas como instrumento de diplomacia.
No mesmo ano, recebeu o Nobel da Paz por negociar a trégua com o Vietnã. A premiação foi muito criticada, mas nem isso nem o escândalo Watergate, que levou à renúncia de Richard Nixon, abalaram o diplomata americano mais poderoso do século 20.
Kissinger ficou no cargo até o fim do governo de Gerald Ford, em 1977, e continuou a ser uma referência na diplomacia, consultado por vários presidentes nas décadas seguintes, republicanos e democratas.
Na América Latina, a preocupação de Henry Kissinger era bloquear qualquer influência soviética. O então secretário de Estado americano ajudou a implantar ditaduras na região e teve um papel direto no golpe militar do Chile, que derrubou o presidente de esquerda Salvador Allende, em 1973.
Investigações no Chile e na Europa revelaram que Kissinger patrocinou ações que enfraqueceram o governo Allende, eleito democraticamente, e abriram caminho para o golpe. Milhares de pessoas morreram e foram torturadas na ditadura chilena.
O Brasil já estava sob o regime militar quando Kissinger entrou no governo americano. O secretário de Estado aprofundou os laços com Brasília e ajudou a alçar o Brasil ao posto de potência regional.
"Ele achou que o Brasil poderia se alinhar aos Estados Unidos e ajudar os Estados Unidos a lutar a Guerra Fria na América do Sul. Que o Brasil poderia, por exemplo, se infiltrar e ajudar os Estados Unidos no Uruguai, na Argentina e no Chile", conta Matias Spektor, professor de Relações Internacionais da FGV.
Documentos oficiais do governo americano, divulgados em 2018, revelaram que Kissinger sabia que o regime militar brasileiro executava opositores.
Kissinger permaneceu ativo como consultor em política internacional até o fim da vida. Sempre defendeu suas decisões, algumas controversas. Alegava que todas foram tomadas com um único objetivo: proteger os Estados Unidos.
Repercussão
Líderes mundiais reagiram à morte de Henry Kissinger
A Rússia foi um dos primeiros países a se manifestar sobre a morte de Henry Kissinger. O presidente Vladimir Putin exaltou o diplomata como um estadista sábio e pragmático, responsável por realizar os acordos mais importantes entre a então União Soviética e os Estados Unidos.
Kissinger visitou a China mais de 100 vezes - a última, há quatro meses. O presidente Xi Jinping disse que Kissinger fez contribuições históricas para normalização das relações entre China e Estados Unidos.
Em visita ao Oriente Médio, o secretário de Estado Antony Blinken afirmou:
"Kissinger estabeleceu o padrão para todos que seguiram neste trabalho. Poucas pessoas moldaram tanto a história como ele".
A Casa Branca ficou em silêncio durante o dia todo. No meio da tarde, o porta-voz do Conselho de Segurança Nacional afirmou, durante uma entrevista coletiva, que foi uma "perda grande concorde com ele ou não". Mas ao ser questionado se existia alguma razão para o governo não tivesse feito um comunicado oficial, John Kirby respondeu: "Eu não tiraria nenhuma interpretação disso".
Agora há pouco, Biden divulgou um comunicado, afirmou que muitas vezes os dois discordaram fortemente, mas que o intelecto feroz e o profundo foco estratégico de Kissinger ficaram evidentes.
O assessor da Presidência do Brasil para assuntos internacionais, Celso Amorim, falou sobre Kissinger em Dubai, onde está pra COP-28:
"Comportamento muito duvidoso, discutível e condenável mesmo, eu diria, em relação à América Latina e, certamente, no caso do Camboja, nos anos 70. Por outro lado, um grande estrategista e uma pessoa com uma visão da necessidade da busca de um equilíbrio no mundo".
O presidente do Chile compartilhou na internet uma mensagem do embaixador do país nos Estados Unidos:
"Morreu um homem cujo brilho histórico não conseguiu esconder sua profunda miséria moral".FONTE: https://g1.globo.com/jornal-nacional/noticia/2023/11/30/ex-secretario-de-estado-americano-henry-kissinger-morre-aos-100-anos-veja-repercussao.ghtml